domingo, 29 de setembro de 2013

GIBRAN-ENTRE A NOITE E A AURORA






ENTRE A NOITE E A AURORA

Cala-te, meu coração. Pois o espaço não te ouve.
Cala-te, pois o éter, sobrecarregado de lamentações e gemidos, não levará tuas canções e teus cânticos.
Cala-te. As sombras da noite não se interessam pelos teus segredos sussurrados, e as procissões das trevas não se detêm diante de teus sonhos.
Cala-te, meu coração. Cala-te até a aurora. Pois quem espera pela aurora com paciência, enfrentará a aurora com fortaleza. E quem ama a luz será amado pela luz.
Cala-te, meu coração, e ouve-me.
Em sonho, vi um rouxinol cantar por cima de um vulcão em atividade.



E vi um lírio levantar a cabeça acima da neve.
E vi uma fada nua dançar entre os túmulos.
E vi uma criança brincando com os crânios, e rindo.
Vi todas essas imagens em sonhos, e quando acordei e olhei em volta de mim, vi o vulcão em atividade, mas não ouvi o rouxinol, nem o vi.
E vi o espaço espalhar a neve sobre as campinas e os vales, e enterrar sob suas mortalhas brancas o corpo dos lírios.
E vi filas de túmulos, eretos diante do silêncio dos séculos; mas, em meio a eles, ninguém dançava ou rezava.
E vi um montículo de crânios; mas ninguém ria, lá, senão o vento.
No meu despertar, só vi tristezas e prantos. Aonde foram as alegrias dos sonhos? E seu esplendor, e suas imagens? E como pode a alma aguentar até que o sono lhe devolva as sombras de suas esperanças e aspirações?
Presta atenção ao que estou dizendo, ó meu coração.
Ontem, minha alma era uma árvore forte, cheia de anos. Suas raízes penetravam nas profundezas da terra, e seus ramos atingiam o céu.
E minha alma floresceu na primavera, e deu frutos no verão. E quando chegou o outono, colhi os frutos em bandejas de prata e coloquei as bandejas nos caminhos públicos, e os transeuntes as apanhavam e comiam e prosseguiam seu caminho.
E no fim de outono, olhei e vi nas minhas bandejas e vi apenas um fruto que os transeuntes haviam deixado. Apanhei-o e comi-o e achei-o amargo como o fel, azedo como a uva verde. E disse à minha alma:



"Ai de mim! Pus maldição na boca das pessoas e ódio nos seus estômagos. Que fizeste, minha alma, com a doçura que tuas raízes sugaram das profundezas da terra e com o perfume que teus ramos beberam da luz do sol?"
Depois, arranquei a árvore da minha alma, por mais forte e cheia de anos que fosse.
Arranquei-a, com suas raízes, da terra onde havia brotado e crescido; arranquei-a de seu próprio passado, e despojei-a da lembrança de mil primaveras e de mil outonos.
Depois, plantei a árvore de minha alma em terra nova.
Plantei-a num campo distante, afastado dos caminhos do tempo. E velei-a, dizendo: "As vigílias nos aproximam das estrelas". E reguei-a com meu sangue e minhas lágrimas, dizendo: "No sangue há sabor e nas lágrimas há doçura".
E quando voltou a primavera, minha alma floresceu de novo.
E no verão deu frutos.
E quando chegou o outono, colhi os frutos maduros em bandejas de ouro e coloquei-os na encruzilhada das estradas. E muitos transeuntes passaram, mas ninguém estendeu a mão e apanhou um fruto.
Tirei então um fruto e comi-o. E achei-o doce como o mel e saboroso como o elixir, e mais capitoso que o vinho da Babilônia e mais perfumado que o hálito do jasmim. Gritei então:




"Os homens não querem a bênção em suas bocas nem a verdade em seus corações, porque a bênção é filha das lágrimas e a verdade é filha do sangue."
E voltei e sentei-me à sombra da minha alma num campo afastado dos caminhos dos homens.
Cala-te, meu coração, até a aurora.
Ontem, meu pensamento era um veleiro que oscilava de um lado para o outro com as ondas, e se movia ao sabor dos ventos de uma praia à outra.
E o veleiro do meu pensamento estava vazio de tudo. Só possuía sete vasos cheios, com tinta de sete cores diferentes, tal um arco-íris.
Um dia enfadei-me de viajar pelos mares e decidi voltar com o meu veleiro vazio do meu pensamento para a terra onde nascera.
E comecei a pintar meu veleiro com cores amarelas como o pôr do sol, e verdes como o coração da primavera, e azuis como o teto do céu, e vermelho como o horizonte em chamas; e desenhei sobre as velas e o timão, formas estranhas que atraem a vista e encantam a imaginação. E ao término de meu trabalho, apareceu o veleiro de meu pensamento com a visão de um profeta vagando entre dois infinitos: o mar e o céu. Entrei então no porto da minha terra, e o povo saiu ao meu encontro com aleluias e regozijos, e conduziram-me à cidade ao som dos tambores e das trombetas.
Fizeram tudo isto porque o exterior de meu veleiro era colorido e atraente, mas ninguém entrou no interior do veleiro do meu pensamento.
E ninguém perguntou o que havia trazido de além-mar no meu veleiro.
E ninguém soube que o havia trazido vazio ao porto.
Então disse, comigo mesmo: "Enganei a todos, e, com sete vasos de cores, iludi seus olhos e sua imaginação."
Um ano depois, embarquei novamente no meu veleiro.
Visitei as ilhas do Oriente e lá recolhi a mirra, o sândalo e o âmbar.
E fui às ilhas do ocidente onde recolhi a poeira do ouro, o marfim, o zircônio e as esmeraldas, e todas as demais pedras preciosas.
Eu fui às ilhas do Norte e delas trouxe as sedas e os bordados.
E às ilhas do sul, de onde trouxe as espadas e os escudos mais aperfeiçoados, e todas as variedades de armas.
Enchi o navio de meu pensamento de todas as coisas valiosas da terra e de todas as curiosidades. E voltei ao porto da minha terra, pensando:
"Agora meu povo me glorificará com razão e me receberá com regozijo merecido."
Mas, quando atingi o porto, ninguém saiu ao meu encontro, e percorri as ruas de minha cidade, sem que ninguém me desse a menor atenção.
E falei nas praças públicas, enumerando os tesouros que havia trazido. Mas o povo olhava-me com desprezo ou zombava de mim e passava.




Voltei ao porto, triste e perplexo. E quando vislumbrei meu navio, dei-me conta de uma coisa que não me apercebera nas ocupações da minha viagem. Gritei, dizendo:
"As ondas do mar apagaram a pintura das paredes de meu navio e ele apareceu como um esqueleto. E o calor do sol e os ventos e a espuma do mar apagaram os desenhos de suas velas e elas parecem farrapos cor de cinza."
Reuni os tesouros do mundo num caixão flutuante sobre o mar, e voltei ao meu povo; e ele me renegou, pois seus olhos só vêem as aparências.
Naquele momento deixei o veleiro de meu pensamento e fui-me à cidade dos mortos e sentei-me no meio dos túmulos pintados de branco a meditar sobre os seus segredos.
Cala-te, meu coração, até a aurora.
Cala-te, pois a tempestade ri do murmúrio de tuas profundezas, e as grutas do vale não repetirão o eco das vibrações de tuas cordas.
Cala-te, meu coração, até a aurora. Quem espera pela aurora com paciência, a aurora o abraçará com afeição.
Eis que a aurora está chegando. Fala, meu coração se puderes falar.
Eis a procissão da aurora, ó meu coração. Terá o silêncio da noite deixado nas tuas profundezas uma canção com que acolher a aurora?
Os bandos dos pombos e de rouxinóis esvoaçam, passando de um lugar a outro nos cantos do vale. Terão os temores da noite deixado bastante força nas tuas asas para que possas voar?
Os pastores levam seus rebanhos aos campos verdes. Terão os fantasmas da noite deixado energias para que os sigas?
Os jovens e as jovens caminham devagar rumo aos vinhedos. Por que não te levantas e caminhas com eles?
Levanta-te, meu coração. Levanta-te, e caminha com a aurora. Pois a noite já se foi. E os temores da noite desvaneceram-se.
Levanta-te, meu coração, e eleva tua voz numa canção. Quem não participa das canções da aurora é incluído entre os filhos das trevas.


sexta-feira, 27 de setembro de 2013

PROJETO CÓRREGO LIMPO



Imagine se aquela pequena vala negra, que passa próximo à sua casa, pudesse se tornar verdadeiramente um pequeno córrego de águas límpidas, onde se pudesse até ver pequenos peixes nadando livremente. Imagine você poder até se banhar naquelas águas em que, desde que você se entende por gente, reinam apenas o mau cheiro, os ratos e o lixo boiando.



Parece um sonho, não?! Pois é, meus caros amigos; isso não é um sonho, pois trata-se de uma realidade para muitos moradores da região metropolitana de São Paulo. Já foram despoluídos 139 córregos - num esforço conjunto da Sabesp com as prefeituras e com a população - desde o início do projeto, em 2007. A cidade de Campo Grande-MS também está com um projeto em andamento.



Para que esse tipo de projeto se torne uma realidade, é necessário que haja muita vontade política, um engajamento sincero das prefeituras e, fundamentalmente, a participação e o comprometimento da população.


Parece que nessas cidades está ocorrendo uma conscientização no sentido de tentar limpar essa “mancha negra” vergonhosa que acompanha o crescimento populacional nas cidades do nosso país. É um esforço louvável e exemplar que serve como modelo nacional para esse enorme problema – o uso dos rios como meio de transporte de efluentes sanitários e industriais que, aliás, é um problema recorrente em várias regiões do planeta.
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Segue abaixo a apresentação do fantástico projeto que consta no site da Sabesp.



Despoluir córregos, preservar cursos d’ água e ampliar a coleta e o tratamento dos esgotos. Este é o principal objetivo do trabalho desenvolvido pela Sabesp.

As obras são realizadas para afastar, coletar e tratar os esgotos, evitar ocupações irregulares e o lançamento de lixo de forma indevida em ruas e às margens dos córregos. 
Até o momento, 139 córregos foram despoluídos e mais de mil litros de esgotos por segundo foram encaminhado para tratamento nas estações da Sabesp.

O trabalho ainda dependa da parceria com as prefeituras, em muitas das suas atividades, especialmente em remover entulhos e sedimentos das margens e leitos dos córregos, bem como ordenar a ocupação das faixas ribeirinhas.

Na 4ª fase, as intervenções terão continuidade em importantes córregos de São Paulo, como Ipiranga, Itaim, Tiquatira, Verde (Estádio Itaquerão), Mandaqui, Pirituba, Itupu São José, Traição e Pirajussara-Mirim.

Córregos Despoluídos


Desde o seu início, o Programa já contemplou três fases detalhadas a seguir. 

A 1ª fase do projeto, iniciada em março/2007 e concluída em março/2009, despoluiu 42 córregos, sendo:

Região Central: Boaçava, Cipoaba (a montante do cruzamento da Av. Roberto Pires Maciel com a Rua Fortaleza de Paranaguá), Corujas (trecho a céu aberto – Av. Corujas até Rua Romeu Perroti), Lago da Aclimação/Pedra Azul, Rodrigo de Lucena, Sapateiro/Lago do Ibirapuera, Venda Velha, Vila Hamburguesa.

Região Leste: Armênio Soares, Cruzeiro do Sul, Franquinho (trecho Rua Aricá Mirim), Franquinho (trecho Rua Esperantina), Itapegica/ Mongaguá (montante - Nascente até Rua João Antônio Andrade), Limoeiro (Córrego da Garagem – Av. São Miguel até Arraial de Santa Bárbara), Ponte Rasa (montante - Nascente até Rua Sonho Gaúcho), Rincão (trecho Rua André Francisco).

Região Norte: Água Preta - Mandaqui, Buraco da Onça, Carandiru/Carajás (despoluído das nascentes até o Parque da Juventude), Charles de Gaule, Da Biquinha, Flor de Maio, Horto Florestal/Ciclovia, IPESP, Jardim Elisa Maria, Lago Horto Florestal/Pedra Branca (despoluído das nascentes até o Lago das Capivaras), Lago Parque Toronto, Novo Mundo, Tenente Rocha, Vale do Saber.

Região Oeste: Caxingui, José de Araújo Ribeiro, Nascente do Sapé.

Região Sul: Cemitério Campo Grande, Invernada, Iporanga/Esmeralda, Kagohara/Itupu, Parque Severo Gomes, Parque do Cordeiro, Rio das Pedras (montante da linha férrea CPTM), Tanquinho (trecho 1 - Afluente da Rua Matilde Nassar Curi), Tanquinho (trecho 2 - Afluente da Rua Emily Dickinson).

Na 2ª fase (concluída em dezembro de 2010) foram despoluídos mais 56 córregos, que são: 

Região Central: Alto de Pinheiros, Bellini, José Langrange, Fongaro, Nove de Julho, Rebouças - Verde 1, Água Branca e Jurubatuba.


Região Leste: Bartolomeu Ferrari, CDHU - Guaianazes A, Coutinho, Da Rua Benedito Brandão, Da Rua Dr. Flamiano Costa, Da Rua El Rey, Da Rua Macela do Campo, Da Rua Quinta Sinfonia, Da Rua Rio do Ouro, Da Rua Tancredo Neves, Fazenda Velha, Guighi Shigueta, Jardim Nazaré, Jardim Pedra Branca - Afluente dos Cunhas, João Abreu Castelo Branco, Mandy, Nascente do Jacuperval, Nascentes da Rua Castanho da Silva, Parque da Consciência Negra, Parque Primavera.

Região Norte: Da Rua Águas de Prata, Da Rua Alfredo Soncini, Da Rua Carandaí – Alambari, Recanto dos Humildes, Ribeirão Tremembé Afluente, Vila Aurora, Ribeirão Vermelho - Afluente Lago Parque Jaraguá, Adão Ferraris, Da Divisa, Da Rua Dora, Da Rua Jardimirim, Ferrão.

Região Oeste: Corveta Camacuã, Nascente do Continental, USP, Albert Bartholome, Ibiraporã, Coimbra, Da Rua Guilherme Fongaro.

Região Sul: Afluente da Av. Nova Arcadia, Campininha, Castelo, Cemitério de Congonhas, Da Rua Jaime de Oliveira e Souza, Dom Bosco, Parque Jardim Herculano, Aterrado-Zavuvus, Maria Joaquina.

Na 3ª fase foram entregues 41 córregos despoluídos (dezembro de 2012), a saber: 

Região Central: Bela Vista, Curtume, Da Rua Gastão de Almeida, Da Rua Quirino dos Santos,
Da Rua Cosme de Souza, Da Rua João Lanhoso; 

Região Leste: Da Rua Candapuí, Da Rua Desembargador Fausto Whitaker Machado Alvim, Furnas Leste;

Região Norte: City Jaraguá IV, Da Praça General Fernando Valente Pamplona, Da Praça Capitão Mor Botafogo, Itaguaçu, Da Rua Joaquim, Oliveira Freitas, Da Rua José Moraes, Da Rua Manoel Martins da Rocha, Da Rua Sete Quedas, Jardim Rosinha, Da Rua Emílio Vendrell, Santa Teresinha, da Rua Dr. Marrei Junior;Região Oeste: Da Avenida do Imigrante Japonês, Dalva, Da Rua Filomena Blois Rizzo, Da Avenida Engenheiro Alexandre Mackenzie;

Região Sul: Da Rua Lira Cearense, Cajazeiras, Do Parque Municípal Jacques Cousteau, Do Yatch Clube Santo Amaro, Israel, Julião, Braço Taquacetuba - Afluente da Av. Noel Nutels, Braço Taquacetuba - Afluente da Av. Jatobás, Braço Bororé - Residencial dos Lagos, Da Rua Canumã, Chácara do Conde, São José - Afluente da Rua Macarena, São José - Afluente da Rua Venâncio Poletti, Do Clube Náutico, Braço Taquacetuba – Afluente da Rua João de Barros.

Programas nas comunidades


O sucesso do projeto depende da participação e envolvimento da comunidade, uma vez que as obras realizadas devem ser mantidas e preservadas. Desta forma cabe à população cuidar dos córregos e das áreas ao redor para evitar o depósito de lixo, lançamento de esgotos clandestinos e ocupações irregulares. 

Para isso é desenvolvido um trabalho de educação ambiental em que os moradores são convidados a participar do processo identificando a importância do córrego para a sua região e a necessidade da despoluição para a melhoria da qualidade de vida da população não de forma isolada, mas com ganhos a todos os municípios.

Dentre as ações adotadas está o resgate da importância do córrego para a região por meio de históricos, palestras e trabalhos apresentados pelas próprias pessoas sobre o que elas conhecem e realizam para a continuidade do programa.

Outros municípios

O objetivo da Sabesp é caminhar para a limpeza de todos os córregos na sua área de atuação na Região Metropolitana de São Paulo. Desta forma, ações estão sendo realizadas para promover o mesmo tipo de trabalho integrado entre a Sabesp x Prefeituras x População para despoluir os demais córregos metropolitanos até 2018.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

CERRADO BRASILEIRO-RESPONSABILIDADE DE TODOS



Não são poucos os problemas de gestão ambiental no território brasileiro, aliás este é um grave problema que afeta grande parte dos países do globo terrestre, tanto os mais quanto os menos desenvolvidos.
Os países desenvolvidos vivem o dilema do progresso contra o meio ambiente, ou seja, na frenética e gananciosa corrida para se manter no topo da economia global, exploraram massivamente seus recursos naturais - numa época em que não havia "tempo" para pensar no desenvolvimento de técnicas de estudo de impacto ambiental -, determinando, assim, o grande paradoxo do nosso tempo: a exploração dos recursos naturais é a chave para o bem e o mal estar da humanidade. Hoje, pagam um alto preço no desenvolvimento de novas tecnologias para consertar os estragos.
Os países menos ou nada desenvolvidos, exploram seus recursos, não exatamente visando o progresso, mas por questão mesmo de sobrevivência, de vida ou morte - tal qual nos primórdios da humanidade, porém com populações absurdamente maiores, e, consequentemente, os impactos, também. Ou seja, o fazem sem possuir as devidas tecnologias e recursos financeiros, portanto seguem, também, rumo ao colapso.
Há ainda os países com desenvolvimento em andamento, a largos passos, tentando "um lugar ao sol". É neste grupo que o Brasil se enquadra. A fundamental diferença, é que não precisam de um modelo de desenvolvimento predatório, pois não vivem naquela época de desconhecimento e/ou despreocupação com os impactos que serão gerados, em relação ao primeiro grupo; e não precisam do modelo de exploração inconsciente, desesperada, pois têm tecnologia e recursos financeiros, ou seja, não é questão de vida ou morte, em comparação ao segundo grupo.
Em resumo, os países em desenvolvimento "estão com a faca e o queijo na mão"; têm o privilégio de não estar na mesma situação dos países mais pobres, e de estar na confortável posição de poder determinar seu desenvolvimento de forma racional, equacionando as variáveis do processo, não incorrendo no mesmo erro dos países mais ricos; pois a maioria dos impactos ambientais são irreversíveis - tal como os observados nos Estados Unidos (Everglades-Flórida), ou no Mar de Aral (na antiga União Soviética (Cazaquistão/Usbequistão).

O CERRADO

Apesar de não figurar frequentemente nas pautas da política e da mídia - como está a Amazônia -, o Cerrado é uma ecorregião de suma importância. Corresponde a aproximadamente 25% do território brasileiro, e é um dos ecossistemas mais complexos, sensíveis e de maior biodiversidade do planeta.
Para se ter uma ideia do potencial do Cerrado, seus mananciais abastecem importantes bacias hidrográficas, tais como: Bacia do São Francisco, Bacia do Araguaia/Tocantins e Bacia do Paraná, além de outras nove, grandes e importantes. É imprescindível frisar que o Cerrado é uma variável fundamental no equacionamento do clima, pois está localizado "estrategicamente" mais para o centro do país e do continente sul americano, tendo influência significativa (como parte da equação) no clima que abrange todo o Brasil, bem como o continente, e, consequentemente, todo o globo terrestre.
Na visão desenvolvimentista de hoje, nos deparamos com o grande risco que o Cerrado está correndo. Nos primeiros estudos, a área abrangente por este bioma foi apontada como desinteressante, tanto para a agricultura - devido à acidez e pobreza do solo -, quanto como área de preservação ambiental - devido ao desconhecimento de seu verdadeiro potencial. Entretanto, hoje, já é notória a capacidade, tanto para um, quanto para outro.
É, no mínimo, duvidosa a conclusão dos primeiros estudos. O fato é que foram desenvolvidas novas tecnologias para a implantação da agricultura - principalmente da soja -, e só mais tarde, tardios estudos, realmente conclusivos, foram implantados para verificação da importância deste bioma.


AMEAÇAS

Além da soja, somam-se às ameaças ao Cerrado, o potencial destruidor da pecuária e da indústria siderúrgica de ferro gusa.
  • SIDERURGIA
A indústria siderúrgica destinada à produção de ferro gusa - que se utiliza de carvão vegetal na produção - é uma das principais causas devastadoras do Cerrado. Estão localizadas no norte do país (Pará e Maranhão) e no sudeste (Minas Geraes).
Os impactos deste tipo de desmatamento são catastróficos, pois ao longo das décadas - sabendo-se que começou nas proximidades das siderúrgicas - devastou tudo ao redor das indústrias, e hoje, já chega a mais de 1000 Km delas (referente às indústrias do sudeste); ou seja, para que a coisa se torne viável, gera mão de obra escrava e infantil, indo muito além do problema dito "ambiental" - entre aspas, pois não há dissociação entre ambiental e social.
A utilização de madeira ilegal como combustível, representa uma economia de 12%, em relação `a madeira legal - proveniente de reflorestamento, basicamente de eucaliptos. Em relação ao carvão mineral, além de maiores vantagens econômicas, o carvão vegetal não apresenta enxofre em sua composição, o que melhora a qualidade final do produto, tornando-o ainda mais competitivo.
Diante deste quadro, é imprescindível a participação de toda a sociedade, frente a este perigo iminente. O valor de um produto, está diretamente ligado a nossa qualidade de vida futura. Ou seja, não é admissível que o valor de um produto seja reduzido em detrimento de nossa qualidade de vida.
  • AGROPECUÁRIA
As principais transformações causadas pela agropecuária no Cerrado tiveram início em 1960, devido à pressão do Plano de Metas do governo Juscelino, cujo objetivo era o equilíbrio da balança comercial. Foram criados programas de desenvolvimento para o Cerrado, tais como o PADAP e o POLOCENTRO, que ofereciam ao produtor rural, além de diversos subsídios, seguro contra riscos, visto que iriam produzir em terras desconhecidas.
Os desmatamentos para a agricultura (principalmente de soja) e pecuária de bovinos já reduziram o Cerrado a menos de um quarto de seu tamanho.
O uso de agrotóxicos e fertilizantes utilizados nas lavouras estão contaminando os lençóis freáticos e os rios que abastecem as populações. As queimadas estão contaminando a atmosfera, além de provocar a exposição do solo e consequente desertificação.
O estado de Goiás já sofre com problemas no abastecimento de água devido à devastação das matas ciliares das nascentes do rio Araguaia. Também os atuais recordes de baixa nas taxas de umidade no centroeste brasileiro, têm origem no desmatamento do Cerrado. O assoriamento do rio Taquari (um dos principais formadores do Pantanal) já anuncia problemas que interferem na saúde do Pantanal.

RESPONSABILIDADE

O objetivo deste texto é, principalmente, de desfazer a equivocada ideia que se faz da ecologia - equívoco este, de responsabilidade dos próprios ditos "ecologistas". Faz-se necessário, portanto, uma distinção entre ecologista e ecólogo: o ecologista pode ser um cientista ou qualquer pessoa defensora das causas referentes ao meio ambiente; um ecólogo, é um especialista em ecossistemas, ou seja, um estudioso dos impactos do homem na natureza, com objetivo de determinar as melhores maneiras de aproveitamento dos recursos naturais.

Há a necessidade iminente de demonstrar que a defesa da Natureza, não é a Natureza em si; não é a defesa de determinado animal, planta ou paisagem, especificamente; o verdadeiro motivo, objetivo, é sempre o bem estar do homem. Por exemplo, a preservação da Amazônia tem relação com a saúde das plantas e dos animais, sim, mas com o objetivo final de proteger o próprio homem, pois da preservação deste ambiente, depende o bem estar do homem.

A ecologia, a geografia, a biologia, assim como a matemática, a física, a química, são ciências; e ciência, é feita pelo homem, em benefício do homem. Ou seja, a matemática, por exemplo, não foi desenvolvida apenas para demonstrar a complexidade dos números, mas para a aplicação deles para a melhoria de qualidade de vida do homem. Enfim, cada disciplina tem seu objeto de estudo, mas todas têm um mesmo objetivo final: o bem estar da humanidade.

Enfim, o equívoco a que me refiro, tem relação direta com o efeito que as causas ecológicas geram em determinada parte da sociedade. Os ecologistas apresentam suas causas de maneira equivocada, tal qual: "temos que proteger a Mata Atlântica". A pergunta é: por que proteger a Mata Atlântica? Por que ela é bonita? Por que ela está cheia de animais e plantas? Por que a Natureza levou milhões de anos para concebê-la? Ora, estes não são argumentos que vão convencer a sociedade. Em muitas destas causas, a sociedade se irrita, e com razão. Imaginem a seguinte situação: a implantação de determinada indústria requer o desmatamento de uma grande área de floresta virgem. A indústria vai gerar empregos e riquezas para o país, e vai produzir impactos significativos na região. São fortes e convincentes os argumentos para a implantação da indústria. Portanto, os apelos para a preservação da floresta não devem ser colocados de forma tão simplista, como o fazem os "ecologistas"; como se a preservação da floresta se resumisse à proteção de algumas espécies de animais ou plantas, por si só, sem as devidas explicações dos impactos que realmente afetarão nossas vidas.

Repito, é preciso uma explicação mais objetiva, mais enérgica, uma explicação que tenha um impacto direto na vida de todos. Ou seja, é preciso demonstrar de que forma a extinção de um rio, de um animal ou planta vai afetar a vida de cada um. É necessário demonstrar, por exemplo, que a devastação de determinada mata ciliar, não é somente pela preservação do mico ou do papagaio, raros, que se reproduzem lá, mas porque é de lá que vem a água que alimenta o determinado rio que abastece as cidades, provendo água potável, alimentos e diversos outros benefícios para as populações.

O Brasil viveu seus momentos em que "precisava" gerar divisas para cumprir as exigências dos acordos com o capital internacional. Este foi o momento em que o Brasil precisou sacrificar o Cerrado para sobreviver e ver surgir o progresso. Este processo já durou quarenta anos, restando apenas 20% do Cerrado. Onde é que isto vai parar? Quando o Cerrado acabar de vez?

A implantção da agropecuária no Cerrado serviu para alvancar o desenvolvimento do país, mas a expansão já foi além das fronteiras aceitáveis. Não estou sugerindo a interrupção imediata destas atividades, mas o estancamento, antes que seja tarde demais. Haverá o momento que isso terá que ser feito. Por que não agora?
Não podemos e não precisamos cometer os mesmos erros dos países desenvolvidos. Basta que observemos o caso dos Everglades na Flórida. Hoje, o que resta está limitado a um parque ecológico. Já foi investido mais de trezentos milhões de dólares em vãs tentativas de reverter parte dos danos causados.

O desastre do Mar de Aral talvez esteja entre os maiores desastres ecológicos do palneta devido à ação antrópica. O paraíso que se encontrava às suas margens - proporcionado pelo progresso imediatista; que não durou mais de vinte anos -, já se encontra a uma distância de aproximadamente 200Km da água. O Mar de Aral está secando, recuando devido à forma desordenada de manejo das matas e dos rios em seu entorno. Ou seja, onde havia água, existe um deserto de sal e areia. Além de causar diversos problemas econômicos e o deslocamento de populações inteiras, este deserto está levando inúmeras doenças respiratórias para toda região.


Acredito que o Mar de Aral seja exemplar como forte argumento em debates quanto às causas ambientais que envolvem impactos de grande porte, como Amazônia, o Pantanal e o Cerrado. A exploração inconsciente dos recursos naturais em torno do Mar de Aral- plantações de algodão e milho - que visava o progresso imediatista, resultou em consequências desastrosas.



Os últimos estudos de impacto ambiental revelam que o desastre ambiental, capaz de superar o do Mar de Aral, é a destruição do Pantanal Matogrossense. Isto pode acontecer de duas maneiras que representam perigo iminente: a implantação da Hidrovia do rio Paraguai - caso seja feita sem as devidas precauções para evitar o desastre-; e com o atual nível de extinção do Cerrado. O rio Paraguai representa a principal via de escoamento, e o Cerrado, a principal fonte de alimentação de água.

É preciso que sejam implantadas tecnologias para o aumento da produção das lavouras de soja nos limites já impostos por elas, sem o envenenamento do sistema hídrico e sem os desmatamentos; criar políticas para conter a expansão da pecuária, e racionalidade para extinguir de vez a exploração de madeira para a indústria siderúrgica; isso é possível, basta vontade política, pois, no passo que está, a exploração do Cerrado vai durar por, no máximo, vinte anos.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não será possível reverter o quadro que se apresenta, pois a mata do Cerrado não se regenera, ou seja, os 80% que foram destruídos, não serão restituídos. O mal já está feito, mas não pode continuar. O futuro do Brasil depende das decisões tomadas agora, no que diz respeito à gestão dos nossos recursos naturais. ISTO NÃO É UM MANIFESTO "ECOLÓGICO", MAS, ANTES DE TUDO, HUMANO.